JOSEF EUGEN HÖRWATER - Interior de ateliê - Óleo sobre tela - 55 x 36
Para o artista que lida com
o desenho e a pintura, em especial, o ateliê ou estúdio é uma extensão de seu
próprio corpo. Mais que um espaço de trabalho, o ateliê é um refúgio para a
criação, um local quase sagrado onde a sensibilidade se inspira em cada canto.
Nos objetos em desordem, nas tintas impacientes por saírem dos tubos, nos
pincéis exaustos de tanta rotina... O mundo de fora desaparece quando se está
dentro do ateliê. Provavelmente seja um dos poucos lugares onde trabalho,
prazer e agonia tenham o mesmo significado.
EDUARD CLARLEMONT - O estúdio do artista
Óleo sobre painel - 91 x 72
PASCAL-ADOLPHE-JEAN DAGNAN-BOUVERET
Gustave Courtois em seu estúdio
Óleo sobre tela - 48,3 x 63,5 - 1880
EDOUARD DAMMOUSE - Marie Braquemond ao cavalete
Pastel sobre papel - 54 x 45
O termo francês atelier acabou sendo o sinônimo mais
conhecido desse espaço nobre para todo artista. Derivado do latim studium, que veio de studere, ou seja estudar. No inglês
acabou ficando mesmo como studio.
Podemos dizer, de modo geral, que estúdio é o espaço de trabalho para todos os
artistas, de todos os ramos: pintura, arquitetura, cerâmica, escultura,
madeira, fotografia, cinema, animação, produção de televisão, música, sala de
dança... Como francês, atende ainda aos escritórios de moda, além de significar
a casa de um alquimista ou feiticeiro.
AUGUSTE RAYNAUD - Momento com um novo modelo - Óleo sobre tela - 46,22 x 55,88
Esquerda: AURÉLIO DE FIGUEIREDO - Interior
Óleo sobre tela - 127 x 68 - Coleção Agnaldo de Oliveira
Direita: PEDRO WINGÄRTNER - No atelier
Óleo sobre madeira - 54 x 38,3
Desde o século XV, quando o
fazer artístico ganhou uma função mais pomposa, financiada pelos mecenas do
Renascimento, o artista se viu quase que obrigado a criar um espaço especial
para a sua produção. Afinal, os espaços comuns da casa já não serviam mais para
ser o templo reservado da criação e inspiração. Assim nasceram os primeiros
estúdios de pintura ou ateliês, local onde merecia estar aquele ser que parecia
sublime. O artista começava a impor uma aura de respeito, quase um gênio,
possuidor de uma loucura divina, que trazia o mundo do imaginário e da criação
para o contato com os seres comuns. Fico imaginando o ateliê de ninguém menos
que Leonardo da Vinci, que extrapolou todo o significado decifrável de artista,
incorporando o pesquisador cientista, que dissecava cadáveres e projetava
artefatos e construções, como ninguém em sua época e provavelmente como ninguém
até hoje.
GIOVANNI BATTISTA QUADRONE - Hoje é um bom dia - Óleo sobre tela
Esquerda: JEAN-LOUIS-ERNST MEISSONIER - Connoisseur no estúdio do artista
Óleo sobre painel - 24,13 x 19,05 - 1859
Direita: CARLOS CAMBELLAND - Interior de ateliê
Óleo sobre tela - 102 x 65,2 - 1909 - Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro
Com o passar dos séculos, o
estúdio de um artista de sucesso acabou abrangendo também todos os seus
assistentes. Deste modo, ficaram famosas as “oficinas de arte”, que abrigavam o
artista principal e toda sua leva de discípulos e seguidores. Exemplo mais que
respeitável é o do alemão Paul Rubens, que além de ensinar aos iniciantes de
sua época, mantinha com ele os mais habilidosos, que eram aqueles que faziam,
por assim dizer, o trabalho pesado de suas encomendas. Muitos trabalhos de Rubens
foram quase que totalmente executados por esses “ajudantes”.
POMPEO MASSANI - Admiração mútua
Óleo sobre tela
ARTURO RICCI - Divertindo no estúdio do artista
Óleo sobre tela - 106 x 79 - 1884
Os séculos XVIII e XIX
trouxeram os artistas itinerantes, principalmente os europeus, que tomaram por
hábito sair em viagens registrando novos motivos e conhecendo novos povos.
Dessas viagens, traziam uma grande quantidade de novos adereços e objetos, de
culturas completamente diferentes de seus cotidianos. Nascia naquele momento, aquele
conceito de um ateliê de decoração carregada, exibindo os mais exóticos objetos
particulares ao gosto de seu dono. Tornava-se praticamente impossível ver um
único espaço de parede vazio em seu interior. Os ateliês inseriam uma espécie
de minimuseus, abarrotados de porcelanas, pratarias, tapetes, estátuas e
obviamente, trabalhos de artistas amigos ou que atraíam a atenção desses
artistas colecionadores. Muitos artistas acadêmicos adotaram esse hábito e
foram responsáveis por divulgar e preservar culturas nunca vistas no mundo
ocidental, além de conservar artefatos históricos de sua própria cultura.
JOHANNES VERMEER - Alegoria da pintura - Óleo sobre tela - 120 x 100 - Cerca de 1666
ALMEIDA JÚNIOR - O descanso do Modelo
Óleo sobre tela - 98 x 131 - 1882 - Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro
ALMEIDA JÚNIOR - O importuno
Óleo sobre tela - 145 x 97 - 1898
Pinacoteca do Estado de São Paulo
Com o passar dos anos tornou-se mais que
natural representar em pinturas esses espaços sagrados. Principalmente no final
do século XIX e início do século XX, quase todos os artistas deixaram uma
representação de seu próprio espaço. Mesmo anterior a esse período, muitos
foram os artistas que se eternizaram em obras que representaram os seus ateliês
ou de artistas amigos. Johannes Vermeer, por exemplo, se autorretratou pintando Alegoria da Arte, num de seus
trabalhos mais famosos e respeitados. Na pintura brasileira, impossível não
citar os trabalhos mais notáveis com essa temática, executados por Almeida
Júnior: Descanso do Modelo e O Importuno. O primeiro nos mostra um
momento de intimidade entre um artista que repousa e uma jovem que o distrai. No segundo, uma jovem se esconde, evitando os olhares curiosos
de alguém que interrompeu uma seção de pintura. São obras atemporais, todos nos
identificamos com elas em alguma esfera.
JESSER VALZACCHI - Olhar Curioso - Óleo sobre tela - 120 x 130 - 2012
DAVID LEFFEL - 45th Street Studio - Óleo sobre tela - 1968
JEAN-LÉON GÉRÔME - Atelier de Tanagra - Óleo sobre tela - 64,4 x 91,1
Ficou no imaginário popular
o conceito de que o ateliê de um artista seja um espaço o mais desorganizado
possível, com tintas espalhadas pelas paredes e pelo chão, trabalhos inacabados
se amontoando e com um clima soturno e quase gótico. Essa ideia meio romântica
e ao mesmo tempo degradante tem cedido espaço a outros conceitos,
principalmente quando se começou a perceber que o ambiente de um ateliê não é
um ambiente de todo saudável. Solventes bastante voláteis e uma infinidade de
produtos químicos já fizeram com que muitos artistas tivessem suas carreiras
interrompidas e suas vidas dizimadas. Todos os materiais artísticos escondem
substâncias altamente perigosas e manipulá-las em local inadequado deixa seu
risco ainda maior. Por isso, já se pensa hoje em dia num ateliê como um espaço
mais arejado, com menos entulhos e mais propenso a uma carreira artística saudável.
Diversos artistas tem aderido a essa nova proposta e esse é certamente o
caminho mais inteligente.
Ateliê Maurício Takiguthi, durante aula de anatomia.
Vinícius Silva, José Rosário e Juliana Limeira, no ateliê em Dionísio/MG.
Os ateliês continuam a
encantar. Ainda é o templo da criação e onde o artista se sente completamente à
vontade. Mesmo que saia para seções ao ar livre; uma prática altamente
recomendável; ele retorna para a sua “toca” e deixa o mundo externo em descanso
por alguns momentos. Ali, entre criações e experiências, vai se dando ao prazer
dos acertos e à agonia dos objetivos que nunca alcança. Ainda assim, o ateliê
continuará sendo a principal porta para que a arte chegue ao mundo.
Bom dia José.
ResponderExcluirMais um magnífico artigo. Assim fica mais fácil conhecer a boa pintura.
Obrigado.
Que bom poder te tocar assim com a matéria.
ExcluirObrigado por vir mais uma vez e grande abraço!
Ainda ontem pensei em uma matéria com esse tema... fico muito agradecido!
ResponderExcluirTantas obras maravilhosas foram feitas com esta abordagem.
O descanso do Modelo é uma obra belíssima...
valeu meu Amigo!
Abração, sucessos!
É um tema que sempre pensei em escrever, também o acho um dos mais belos da história da arte. E vejo que muitos se identificam com isso também.
ExcluirGrande abraço, Vidal!
Bela matéria e belas pinturas! Estes trabalhos que "abrem" o interior de ambientes inacessíveis para a maioria são motivos dos mais interessantes na pintura. Obrigado!
ResponderExcluirTambém são a minha temática preferida, Thiago.
ExcluirGrande abraço!
Oi boa tarde o senhor
ResponderExcluirda curso de pintura
Olá, bom dia.
ExcluirSim, dou aulas. Estou parado no momento, para o término de um grande trabalho.
Estaremos voltando no segundo semestre.
Grande abraço!
Excelente como sempre, JR!. Aproveito para deixar aqui um tema para os próximos textos: a paleta dos artistas. A paleta é como a identidade do artista. Minto, uma paleta não diz apenas como pinta o artista, suas cores preferidas e tal, mas também diz muito sobre seu jeito de ser - organizado, caótico - entre outras coisas. Já aguardando o mesmo. Abraços!
ResponderExcluirÉ um ótimo tema, Beto.
ExcluirA pesquisa vai ser grande...
Grande abraço!