sábado, 4 de janeiro de 2014

POR DENTRO DE UMA OBRA - John Frederick Lewis

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma loja Kibab, Scutari, Ásia Menor - Óleo sobre tela - 53,3 x 78,7

Em 1840, John Frederick Lewis partiu de Roma para uma viagem que ainda não sabia exatamente o destino. Passou pela Albânia, Corfu, Janina, pelas Montanhas de Pindo e Patrass, Atenas, pelo Golfo de Corinto e Esmirna, até finalmente chegar a Istambul, onde iria residir pelo resto daquele ano. Amou aquele lugar logo à primeira vista. Ficava intrigado como havia uma cultura tão rica, cultivada por pessoas tão simples. Passava horas passeando por todos os mais pitorescos cantos, desenhando, anotando e registrando como podia, tudo aquilo que não lhe cansava os olhos.

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma loja Kibab, Scutari, Ásia Menor - Detalhe 1

Embora grande parte de seus vários estudos focasse mais as construções, também havia espaço em suas pesquisas para a representação do povo local e todos os seus costumes. Lá estão representados o povo comum, soldados, ciganos, senhoras, crianças... Todos nas tarefas e prazeres de suas rotinas. Lugares, pessoas, acontecimentos, tudo isso formaria um rico material com que Lewis trabalharia por anos, depois que retornasse a Londres.
Scutari é uma rua na parte noroeste de Istambul, situada na margem asiática do Bósforo, e que agora é conhecida como Üsküdar, um distrito de Istambul. Durante muitos anos, a área era local de importante comércio, graças à sua boa localização, que lhe dava um porto estratégico e também já lhe havia oferecido um glorioso passado. Era ali uma espécie de central de correios asiáticos, palco para as primeiras linhas férreas da Anatólia, bem como o destino final de caravanas que vinham da Síria e de outros pontos da Ásia. Só por aí já dá pra se ter ideia de como era a efervescência do local e como isso alimentou a criatividade e visão artística de Lewis.

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma loja Kibab, Scutari, Ásia Menor - Detalhe 2

Lojas Kibab vendiam uma espécie de “churrasquinhos”, ou carne espetada assada, se melhor preferir. Este foi o ambiente escolhido por Lewis, para desenvolver um de seus mais belos trabalhos. A riqueza de detalhes da tela é impressionante. Três homens, com vestes ricamente coloridas reúnem-se sob a sombra de um portal. À esquerda, um senhor de idade (provavelmente o dono da loja) lê enquanto repousa. Acredita-se que o homem de barba, de pé, seja o próprio artista se retratando. Ele olha diretamente para o espectador. Os detalhes não param por aí: atente-se para o vaso de rosas murchas mais ao canto, a ornamentação nas cerâmicas chinesas e até mesmo as mais diversas texturas e estamparias de cada veste. Lewis sabia como ninguém manipular as cores e combiná-las perfeitamente tanto à luz quanto na mais profunda sombra. O primeiro plano é iluminado por uma luz intensa de meio-dia. Ao fundo, um grupo de homens conversa animadamente, e mais distante, a cidade aparece majestosa. No plano intermediário, a cena é invadida por uma luz refletida muito bem controlada, que define e valoriza tudo.

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma loja Kibab, Scutari, Ásia Menor - Detalhe 3

Todos os figurantes estão estáticos e o movimento é representado apenas pelos pombos, comprovando aquilo que a composição sugere: um local para se descansar e relaxar num momento de refeição.
Os objetos foram montados em estúdio. Todos certamente garimpados nas muitas compras que Lewis fazia em Istambul e em bazares do Cairo. Eles não sugerem nenhuma opulência e a obra também não teve nenhuma pretensão política. Estão ali apenas representando toda uma cultura e o seu povo. São exatamente o contraste com o requinte europeu, mas exaltam uma riqueza que não tem valor.
Depois que retornou a Londres, Lewis passou a ter uma vida reclusa, concentrando todas as suas forças nas elaborações muito bem estudadas de todos os locais pelos quais havia passado. Cada obra sua era sempre esperada com muita ansiedade.

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma loja Kibab, Scutari, Ásia Menor - Detalhe 4

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John Frederick Lewis nasceu em Londres, a 14 de julho de 1804. Filho de um outro artista, Frederick Christian Lewis. Reconhecido primeiramente por sua excelência na pintura de aquarelas, John Frederick Lewis também foi um artista que produziu bastante com o óleo, guache e outras técnicas. Virtuoso, era extremamente detalhista e nada lhe fugia ao olhar. Especializou-se na pintura de cenas do Oriente Próximo e Médio e também das costas mediterrâneas. Teve vários endereços, mas suas estadias estrangeiras mais duradouras foram na Espanha, entre 1832 e 1834; e no Egito, entre 1841 e 1850.
Ele se associou à Academia Real em 1859 e tornou-se um membro da mesma em 1865. Faleceu em Londres, a 15 de agosto de 1876.

Esquecido por muitos anos depois de sua morte, o trabalho de Lewis passou a ter uma forte valorização a partir de 1970. Atualmente, seus raros trabalhos, quando colocados em ofertas nas melhores casas de leilões, atingem facilmente as cifras dos milhões.

Veja mais algumas obras do artista: 

JOHN FREDERICK LEWIS - Uma lady recebendo visitas
Óleo sobre painel - 63,5 x 76,2 - 1873

JOHN FREDERICK LEWIS - Os peregrinos romanos
Aquarela, guache e grafite sobre papel - 55,6 x 76,5 - 1854

JOHN FREDERICK LEWIS
Um acampamento no Deserto do Monte Sinai
Aquarela, guache e grafite sobre papel - 66,7 x 135,9 - 1856

JOHN FREDERICK LEWIS
A oração e a fé salvarão o doente
Óleo sobre painel - 90,8 x 70,8 - 1872

JOHN FREDERICK LEWIS
Vida em um harém do Cairo
Óleo sobre tela

JOHN FREDERICK LEWIS - Refeição do meio dia
Óleo sobre tela - 88 x 114 - 1875

2 comentários:

  1. A obra de Lewis embora esquecida por muitos anos (difícil de acreditar), tem um poder de paralisar...
    Um artista com um toque especial, principalmente por se tratar de cenas orientais, belíssimo artista, sou apaixonado pelos seus tons...
    Um grande final de semana meu amigo...

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    1. Os trabalhos com temática orientalista são especialmente admirados por mim. São ricos em tudo: na composição, no colorido, nas texturas... Obras especiais do mundo da arte.
      Grande abraço, Vidal!

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