sexta-feira, 5 de abril de 2013

HUMANIZAR PELA ARTE


... O mistério da vida me causa a mais forte emoção. É o sentimento que suscita a beleza e a verdade, cria a arte e a ciência. Se alguém não conhece esta sensação ou não pode experimentar espanto ou surpresa, já é um morto-vivo e seus olhos se cegaram.” (Albert Einstein)
Logo no início do livro Como Vejo o Mundo, Albert Einstein nos deixa excelentes reflexões acerca do mundo e da vida. São as visões de alguém com uma capacidade perceptiva enorme, mas acima de tudo, a visão de um humanista, que devotava uma grande admiração pelas coisas simples e pelo fascínio de se encantar com cada uma delas. Muito mais conhecido pelos seus grandes experimentos e teorias no campo da Física, foi um humanista que dedicou seus últimos anos; mesmo que reclusos; na defesa da construção de ideais que incluíssem a paz e a promoção de um mundo melhor.


SIR LAWRENCE ALMA-TADEMA - Comparações
Óleo sobre tela

A ciência nos afirma que estamos aqui há milhões de anos, que evoluímos de espécies anteriores e que esse processo de evolução torna cada ser desse planeta uma entidade especial. Todas as transformações físicas passadas pelos nossos ancestrais, conquistadas no processo evolutivo desses milhões de anos, foram adaptações do nosso corpo às condições que foram se manifestando no planeta. Somos do jeito que somos, fisicamente falando, graças a um processo de hominização que nos permitiu ser assim, adaptando e evoluindo até chegarmos a nossa condição atual, quando há cerca de 7 milhões de anos seguimos um caminho diferente de outros primatas parentes nossos. Somos especiais? Do ponto de vista apenas físico, não somos mais especiais que uma formiga. Mas, algo nos tornou enormemente diferentes das outras espécies. Foi pela humanização que nos diferenciamos de todos os outros seres. A diferença mais importante entre nós e todas as outras espécies é que não vivemos apenas para o presente, pela intensa preocupação existencial de sobrevivência. Buscamos referências em nosso passado e nos orientamos nele para construirmos nosso futuro. Nenhuma outra espécie no planeta pensa e age assim. Como nos humanizamos?
Preocupamos com os nossos semelhantes e com as outras espécies, mesmo sabendo que muitas delas são até nossos concorrentes na cadeia de sobrevivência. Grande parte de nós, nem todos, se comove com a degradação acelerada do ambiente em que vivemos e uma parcela até considerável, luta para que ele permaneça nas melhores condições possíveis, para que possamos ter uma vida com melhor qualidade. Por vezes, lutamos pelo direito de excluídos e minorias, e muitos de nós ainda mantém acesa a chama da esperança de que dias melhores nos esperam. Humanizar é um processo que inspira coletividade, que nos faz abandonar nossa casca do egoísmo e da indiferença. Fazer planos para a humanidade é planejar algo para mim e para todos aqueles que dividem esse planeta comigo.


MARGUERITE GÉRARD - Artista pintando e retrato de uma musicista
Óleo sobre tela

Várias atitudes comprovam o processo evolutivo de nossa humanização, mas nenhuma delas tem força maior que a nossa manifestação artística. É a arte que comprova nossa trajetória na história e nos faz permitir olhar os passos que nos trouxeram até aqui. Registrando em textos, esculturas, pinturas, construções, compondo músicas e interpretando em palcos a nossa existência, evoluímos em nossa caminhada. A arte nos promove à nossa condição humana mais especial. Principalmente ela, nos permite olhar e encantar com o passado e sonhar e projetar um melhor momento futuro. A arte tem o poder da transcendência. Quem faz arte vive além da vida de seu próprio corpo físico. Pouco nos importa, por exemplo, como era Michelangelo, se era baixo, magro, forte... sua arte lhe representa sem que precisamos lhe conceber uma  forma física. Para a humanidade, isso é o suficiente.
“A superioridade do homem sobre os restantes seres da natureza, é devida aos seus pensamentos inúteis”, já dizia Paul Valéry. Joan-Josep Tharrats completa assim o raciocínio de Valéry: “Se a gente não tivesse essa necessidade de coisas sobrantes, não teríamos superado o nível dos irracionais. A arte é uma realidade inútil, mas são precisamente as coisas inúteis as que fazem vibrar a humanidade”. A arte, enquanto excesso luxuoso de nossa produção, sempre teve o papel de refinar o espírito humano, de aproximá-lo por alguns instantes; do que o próprio homem concebeu; de uma centelha divina. Também é pela arte que atingimos o ápice de nossa liberdade, fugindo com maior satisfação das forças manipuladoras do mundo atual, onde tudo parece mecanizado, programado e vigiado. Há, por isso, uma responsabilidade enorme para não deixarmos que a liberdade conquistada no fazer artístico seja algo puramente egoísta, que não comungue com a promoção de melhores condições para a toda a humanidade. Nesse sentido, muitas manifestações artísticas recentes acrescentam pouco ao coletivo, supervalorizando o mundo individualista de quem as criou. Mas isso já são motivos para novas divagações filosóficas.


VICENTE ROMERO REDONDO - No ateliê do artista - Pastel


Estamos certamente numa encruzilhada. O que se tem produzido atualmente, em muitos segmentos artísticos, caminha para um comportamento quase irracional, animal mesmo. Produtos do momento, sem referencias ao passado e sem a preocupação em formar uma melhor sociedade futura. A arte, como a ferramenta mais valiosa que temos, para produzir e construir um mundo melhor, corre o risco de não se tornar mais, aquilo que conseguimos produzir de mais nobre até aqui. Que sejamos todos, humanistas devotados em construir um mundo melhor, assim como Einstein se empenhou em seus últimos anos. Estaremos assim contribuindo para justificar o título que nós mesmos nos damos, de criaturas especiais e diferenciadas deste planeta.

6 comentários:

  1. A humanização está presente em todos que acreditam que um mundo coletivo, supera todas as barreiras da ignorância, tornando a evolução não apenas em palavras, mas em atos...
    Bom final de semana, felicidades...

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    1. E como temos esquecido de pensar pelo coletivo...
      Obrigado por vir, Vidal.
      Um grande abraço!

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    2. Se a arte tem alguma função, é a de humanizar, isto é, tornar ativo todo o ilimitado potencial humano. A vida sem arte é desumana.

      Belo texto José,
      Grande Abraço!

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    3. Certamente, Isabelle.
      Engenheiros do Havaí tem uma bela letra pra isso: "Somos quem podemos ser, sonhos que podemos ter!"
      A Arte nos proporciona belos e incomparáveis sonhos.
      Grande abraço!

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  2. A arte nos desperta a conciência, de ser, de ver e refletir sobre si mesmos em relação aos outros e ao mundo.

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    1. Consciência cada vez mais perdida nos últimos tempos, não Paulo?
      Grande abraço a todos por aí!

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