terça-feira, 30 de novembro de 2010

AS QUATRO ESTAÇÕES: Dicas para pintura de paisagens (José Rosário)

EDGAR WALTER - Paisagem
Óleo sobre tela - 65 x 80 - 1982
Com o término do inverno e a chegada das primeiras
chuvas de primavera, a vegetação se enche de brotos e
dá um espetáculo à parte sob a luz da manhã.


Apesar de o território brasileiro ocupar uma grande área, não temos por aqui estações climáticas tão bem definidas quanto a outros países mundo afora. Em quase todo o país, as estações se distinguem principalmente pela queda ou subida de temperatura, ficando assim a sensação que possuímos no ano, apenas inverno e verão.
Uma das causas é que quase a maior parte do território brasileiro está localizada entre as linhas que definem a região tropical do planeta, chamadas: Trópico de Câncer e Trópico de Capricórnio. Abaixo e acima dessas linhas, as estações já se definem com mais nitidez.
Mesmo assim, o mudar das estações aqui no Brasil traz alterações consideráveis. Com o olhar um pouco mais curioso, podemos detectar que essas mudanças realmente acontecem. Elas interferem, e muito, no resultado das composições de paisagens.


T.M. NICHOLAS - Porto de Essex
Óleo sobre tela - 76 x 102
Em países localizados mais ao norte e ao sul do
globo terrestre, o inverno é marcado principalmente
pela incidência de grandes nevascas. Para captar cenas
como essas, é preciso um olhar atento e criterioso, pois são
bem variados os tons de cinzas azulados.

O volume de folhagens das árvores, o colorido mais ou menos acentuado, o aumento ou diminuição de contrastes, a umidade... Vários fatores como esses fazem com que certas cores entram ou saiam da paleta em momentos diferentes do ano. O uso correto de cores alternativas para estações diferentes, pode auxiliar consideravelmente para a captação desses sutis efeitos.
Se você quiser conseguir suas misturas usando apenas as cores primárias e secundárias, que é aliás uma regra que acho bastante desafiadora e instrutiva, desconsidere essas minhas próximas dicas. Agora, se acha que algumas variações dessas cores possam realmente colaborar com a obtenção de misturas mais ricas, essas sugestões serão bem válidas.



Clyde Aspevig e Carol Guzman pintando ao ar livre.
O exercício no local permite selecionar melhor os tons e as cores,
além de tornar o trabalho mais dinâmico e seguro.

CLYDE ASPEVIG - Pinheiros no outono
Óleo sobre tela - 76 x 102
Não temos no Brasil, estações muito bem definidas como certas regiões
dos Estados Unidos e países do hemisfério norte. Nessa demonstração,
Aspevig explora muito bem os tons quentes do outono americano.

Procurei criar uma paleta para cada estação do ano, tomando como referência a paisagem mineira, que é onde vivo, e na qual posso vivenciar minhas experiências. Ilustrarei com trabalhos meus e de outros artistas, que mesmo distantes da região onde moro, conseguiram misturas muito próximas das que consegui.
O exercício que mais ajudará na comparação dos efeitos das cores sobre as estações é, seguramente, a pintura ao ar livre (plein air painting). Sempre que possível, faça uso dessa poderosa atividade.
Em todas as paletas utilizei o branco de titânio, por se tratar da variedade menos tóxica dessa cor. Toxicidade é aliás, assunto para uma das próximas matérias.

VERÃO
O verão talvez seja a estação do ano que mais desafios ofereça ao artista, para a captação de seus efeitos. O verão brasileiro é, quase que na totalidade do território, muito úmido. Isso favorece o crescimento constante e maciço de vários tipos de plantas simultaneamente, criando um visual com predominância excessiva de verdes. Não é muito fácil, principalmente a iniciantes, captarem diferenças mínimas entre os verdes e fazerem delas aliadas seguras para ajudarem em sua composição. É de muita valia nessa empreitada, uma composição equilibrada, que mescle vegetação e áreas limpas, com a mostra de diferentes tonalidades de terras, bem como explorar cenas mais abertas, que dêem ênfase aos céus variados e geralmente nebulosos dessa estação.
Paleta de verão
Branco de titânio
Amarelo limão
Amarelo ocre
Verde esmeralda
Verde vessi
Azul de cobalto
Azul ftalo
Azul ultramar
Vermelho de cromo claro
Terra se siena natural
Terra de siena queimada
Carmim
Sépia
JOÃO BATISTA DA COSTA - Paisagem em Petrópolis
Óleo sobre tela - 102 x 150
Poucos artistas souberam captar tão bem a atmosfera de um verão
tipicamente brasileiro. Perceba que o excesso de verde que prejudicaria
uma composição amadora, ganha sofisticação nas mãos desse hábil pintor.
Tons mais azulados para as sombras e quentes sob a luz.

CÂNDIDO OLIVEIRA - Paisagem rural
Óleo sobre tela- 70 x 100
Áreas abertas, céus nebulosos e diferentes tons para os verdes:
receita para uma boa composição de verão.

LUIZ PINTO - Encosta com árvore
Óleo sobre tela
Uma composição aparentemente simples, mas muito bem equilibrada. Uma 
faixa de verde mais quente atravessa o centro da composição. Em tons bem
escuros, a árvore foi deslocada para a direita, permitindo ao observador se
deixar guiar até o fundo.


OUTONO
Intercalando a estação quente do verão e geralmente fria do inverno, está o outono. É nesse período que as árvores perdem suas folhas e se preparam para as menores temperaturas que virão. E o que mais encanta nessa estação é exatamente isso, a transformação pela qual passam todos os vegetais.
Tenho uma atração muito grande por essa estação, pois ela permite o uso de uma paleta mais quente, com predominância de cores mais terrosas e bastante variadas. Os céus se tornam mais límpidos e os tons neutros parecem se realçar, pois estão sempre rodeados de alguma cor avermelhada ou próxima disso. Os galhos e troncos também ficam mais evidentes, criando uma variedade imensa de silhuetas e texturas.
É uma ótima oportunidade para você confirmar, pela observação, que a paisagem brasileira não é tão verde como se imagina. Exercícios ao ar livre são ideais para essa época, pela pouca incidência de chuvas que ocorre. É a estação ideal para você incrementar mais colorido em seus trabalhos.
Paleta de outono
Branco de titânio
Amarelo de cádmio claro
Amarelo ocre
Amarelo indiano
Terra de siena natural
Terra de siena quimada
Sombra queimada
Azul de cobalto
Azul ultramar
Vermelho de cádmio claro
Sombra natural
Terra de sombra queimado
Verde óxido de cromo
Verde veronese
Sépia

MAURO FERREIRA - Beira de rio com cabras
Óleo sobre tela - 30 x 40

JOSÉ ROSÁRIO - Paisagem com pequeno leiteiro
Óleo sobre tela - 60 x 90

CLÓVIS PÉSCIO - Paisagem com cargueiro
Óleo sobre tela - 50 x 70
Acima, três situações de paisagens brasileiras em pleno outono.
Observe o uso de verdes queimados e a colocação de vários
tons terrosos em todas as composições.

INVERNO
O Brasil tem pouquíssimas regiões onde a ocorrência de geadas e neve dão sinais de presença no inverno. Com exceção da região sul, o restante do país só observará geadas mais intensas em terras mais altas de cadeias montanhosas do sudeste. Portanto, o inverno traz muito mais a lembrança de dias com bastante cerração e de coloridos mais desbotados.
Prepare para usar nessa estação diversas misturas de tons neutros. É também uma ótima oportunidade para aprender a trabalhar com todas as variantes de azuis e cinzas.
Não é de se estranhar que às vezes, mesmo sob frio intenso, o céu se abra num azul vívido e ensolarado. É nessa hora que os cinzas, que no início da manhã se pareciam mais azulados, tornam-se então mais dourados e terrosos, abrindo uma possibilidade para um colorido mais diversificado nessa estação que aparentemente é mais sombria.
Paleta de inverno
Branco de titânio
Amarelo limão
Amarelo ocre
Azul ftalo
Azul ultramar
Azul de cobalto
Gris de payne
Carmim
Violeta permanente
Vermelho de veneza
Terra de siena natural
Sépia
ALEXANDRE REIDER - Animais em beira de rio
Óleo sobre tela 

JOSÉ ROSÁRIO - Começando o dia
Óleo sobre tela - 30 x 40

WILSON VICENTE - Manhã gelada
Óleo sobre tela
Nas três cenas acima, típicos ambientes de inverno brasileiro, onde a presença
de cerração e neblina dão o ar da estação.

PRIMAVERA
É essa uma outra grande estação que tenho preferência para pintar.
Após os longos dias frios de inverno e com as primeiras chuvas do início da primavera, todos os vegetais começam uma profusão enorme de brotos, tornando a paisagem com uma variedade enorme de novos tons e opções de coloridos.
Saia numa manhã ensolarada de primavera e veja como, juntamente com todos os galhos e ramos, ainda secos e avermelhados, também se misturam tons variados de verdes e amarelos dos novos brotos que começam a se desabrochar.
É uma estação mais confortável para todos que iniciam a pintura de paisagens. Os verdes são mais intensos e menos sutis que nas outras estações. Também são menos densos que no verão, quando todas as folhagens já estão amadurecidas. E ainda há a irresistível vontade de colorir um pouco mais as cenas, pela imensa variedade de flores que estão por todos os lados.
Paleta de primavera
Branco de titânio
Amarelo limão
Amarelo ocre
Terra de siena natural
Sombra natural
Terra verde
Azul de cobalto
Azul ftalo
Carmim
Rosa de garança
Verde esmeralda
Verde vessie
Verde viridian
Verde veronese
Vermelho de cádmio claro
Sépia
ANDERSON CONDE - Portal das flores
Óleo sobre tela

JOSÉ ROSÁRIO - Galopando
Óleo sobre tela - 60 x 90

JÉSUS RAMOS - Paisagem com carro de boi
Óleo sobre tela - 80 x 120
A primavera no Brasil é marcada principalmente pela floração dos
ipês. Nessa época, com as primeiras chuvas depois do inverno, a
vegetação se cobre de novos e viçosos brotos.


sábado, 27 de novembro de 2010

BELEZA E ARTE - Parte 2 (José Rosário)

Não sei se o tempo vai nos deixando mais exigentes, ou as coisas estão mesmo seguindo caminhos rápidos demais para o desastre. Fico desconfiado se é minha cabeça que está a ficar mais velha que o corpo, ou há com certeza, um descompasso no mundo das artes, fazendo com que o "nada" e o "vazio" sejam os esteios mais disponíveis para se lançar descanso.
Que me perdoem todos pelo meu possível olhar antiquado, mas gostaria que a beleza não fugisse a passos tão rápidos da arte de minha época. Quero a beleza no seu sentido mais ingênuo, primário. Aquela beleza que faz as pazes imediatamente ao primeiro lance de olhar, entre aquilo que se deseja e o que é oferecido. Não quero a beleza egoísta adequada ao meu gosto, mas também não quero a beleza subdivida, adequada como imposição ferrenha pelos conformes do mercado: beleza conflitante, beleza aterrorizante, beleza incômoda, beleza que gosta de chocar... Não, definitivamente não é essa a beleza que gostaria de ter como companhia. Todos nós sabemos, bem intimamente, que realmente somos capazes de sentir a presença do que é verdadeiramente belo. Tudo que é belo emociona, e contra a emoção não há rival que aguente combate. 
Não falo disso apenas sobre as Artes Plásticas, mas em todas as variantes de manifestações artísticas existentes. Quando não há uma tendência exagerada para a arte de "fácil digestão", há uma queda cada vez maior para uma arte sem diálogo, que choca, que causa repugnação e traz o desejo cada vez mais crescente de não querermos estar próximos a ela.
Músicas já não conseguem casar melodia com poesia, a arte cinematográfica desfila quilos e mais quilos de violência e munição. As bienais que acontecem mundo afora tendem cada vez mais para um espetáculo de entretenimento, fugindo perigosamente de suas reais intenções. Até a Filosofia se tornou um habitat de textos complexos e obscuros, que inibem cada vez mais ao invés de explicar, ficando a sensação de que o saber é uma terra longícua, habitada por seres distantes, dotados cada vez mais de palavras difíceis e vocábulos indecifráveis.
Vivemos um período de caos, do mundo saindo cada vez mais de suas particularidades regionais e se integrando numa visão global que definitivamente não tem mais volta.
É certo e necessário que a arte acompanhe a linguagem de seu tempo, e até aceitável que esse tempo tenha infelizmente, na desordem e no caos, a sua linguagem mais evidente. Mas, também é certo que a arte seja sempre um alento de esperança e a possibilidade do ressurgir de um novo mundo. Não se melhora o mundo cultivando ainda mais a sua linguagem desmedida e confusa. Não se melhora o mundo professando cada vez mais o mal que nele germina. A arte teve e sempre terá a obrigação e o papel de inspirar um novo mundo. Ela registra o que existe, mas também precisa provocar a esperança de um mundo melhor. Tire a esperança do homem e a vida perderá todo o sentido.
No mundo em que vivemos, o "novo" se faz imperativo a cada dia, mas nem por isso, seja tolerável que a novidade possa se impor a qualquer preço, fazendo com que tenhamos que engolir garganta abaixo a sandice de tantos exageros. É perfeitamente cabível fazer arte com qualquer coisa, qualquer objeto, mas é deplorável ter que assistir à repetidas incursões carentes de informação e preparo. Até o que é novidade se encarna numa complicada repetição, jogada ao público e imposta como um conceito quase "acadêmico" e obrigatório a ser seguido. E mais uma vez, a lei do que é mais forte contribui para deixar uma parte de nossa história mal contada.
***
Há várias perguntas perigosas, que requerem um pouco de falta de juízo para serem proferidas e por isso mesmo, obrigatórias: Como isso tomou força tão grande nas últimas décadas? Onde estava todo mundo que permitiu que dia após dia, mais e mais coisas fossem introduzidas arbitrariamente com a permissão e imposição de uma minoria? Por que o conceito e o discurso foram promovidos a primeiro plano e o saber fazer foi rebaixado a segundo? Até quando teremos que aceitar que os modismos sejam elevados a categoria de referência?
Essa conversa vai longe e é preciso fôlego e coragem para poder enfrenta-la.
Por enquanto, vou deixando a todos na companhia de ótimas obras que separei, contemporâneas na essência e compromissadas com aquilo que falei no início e que tenho certeza não abandonará nunca aos comprometidos com a verdadeira arte: a Beleza.


SEZE DEVERES - Escultura
Instituto de Arte Contemporânea Tara Donovan, Boston
DALE FRANK - Sem título
Óleo sobre tela - 180 x 180
YAYOI KUSAMA - Jardim de Narciso
Esferas inoxidáveis
Museu de Arte Contemporânea Inhotim - Brumadinho/MG
OSCAR NIEMEYER - Museu de Arte Contemporânea de Niterói/RJ

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

EXPOSIÇÃO EM CAMPO GRANDE

A exposição ocupou o hall principal do
Shopping Campo Grande, durante o mês de agosto.

Durante todo o mês de agosto desse ano, aconteceu em Campo Grande/MS, uma grande exposição de arte, com centenas de obras de cerca de cinquenta artistas. A organização e realização do evento, realizada no Shopping Campo Grande, ficou a cargo do empresário Carlos Roberto, da Galeria Virtual de Quadros.

José Rosário e Carlos Roberto (Carlinhos).

Alguns artistas foram convidados para fazerem um workshop durante o período da exposição. Para essa atividade, estiveram lá: Ana Cláudia Corsini, Luiza Sartory, Evandro Schiavone, Romano di Martino, José Rosário e Alex Luizi.

Evandro Schiavone
Luiza Sartory
Ana Cláudia Corsini
Romano di Martino
José Rosário terminando a obra:
E por falar nos Três Poderes... Morreram de cabeça quente,
óleo sobre tela, 60 x 90.
Alex Luizi

O artista Romano di Martino pintou seu último quadro nesse evento, vindo a falecer uma semana depois.

Jean (da Galeria Virtual de Quadros), José Rosário e Ieda Pazian (de Araçatuba).

A intenção do empresário Carlos Roberto é colocar a capital sul mato-grossense no circuito de exposições do país, tornando esse evento anual.

José Rosário em passagem pelos estúdios do
Galeria Virtual de Quadros.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

OS ÚLTIMOS DIAS DE PRIMAVERA (José Rosário)

BARBARA EDIDIN - Tão especial...
Lápis de cor sobre papel - 79 x 53
ADRIANA-JOHANNA HAANEN - Flores e pêssegos
Óleo sobre painel - 30 x 25

Dizem que as mulheres é que gostam de flores... Com que sentido especial elas terão nascido para possuírem tão refinado gosto? Tenho pra mim que é coisa do estrogênio, essa vantagem que faz com que elas sempre estejam na frente no que diz respeito a sensibilidade.

HONEY W. KURLANDER - Palmas no jardim de casa
Acrílica sobre tela - 107 x 127
NEIL H. ADAMSON - Asters
Acrílica sobre painel - 28 x 41
TOM BROWNING - Flores silvestres
Óleo sobre tela - 56 x 61

Mas, falando sério, dizer que elas gostam de flores, é desculpa do mundo masculino que tem medo de enxergar uma das faces mais belas da vida.

SUSAN McKINNON - Paleta de primavera
Aquarela - 55 x 74
HOWARD CARR - Chá de rosas
Óleo sobre tela - 46 x 61
JOSÉ ROSÁRIO - Cesto com flores
Óleo sobre tela - 60 x 80

Olhar para uma flor e saber enxerga-la é desfrutar de um pedaço do paraíso.

NANCY ANN FAZZONE - Flores laranjas e brancas
Aquarela - 44 x 68
ELIZABETH BRANDON - Papoulas em vaso francês
Óleo sobre painel - 51 x 41

sábado, 20 de novembro de 2010

DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA

A exposição OLHAR A ÁFRICA: VER O BRASIL completou um ano desde sua inauguração e mostra na Fundação Arcelor/Mittal Acesita. Mais importante do que fazer a exposição é ter me inteirado de toda a necessidade de promover e divulgar esse tema.
Devemos muito à cultura africana e quase sempre esquecemos de agradecer por isso. Um dia no ano não é suficiente para expressar tanto débito. A data é apenas um símbolo. Que a gratidão se incorpore na lembrança em todos os dias.

A FEIRA - óleo sobre tela - 46 x 65
Acervo de Cláudia Bonna

ORUN
(José Maria Honorato)

Em nome da pele - dor!
Em nome dos filhos - rigor!
Em nome do corpo - ardor!
Em nome da beleza - fervor!
Em nome do brilho - furor!

O PENSADOR - óleo sobre tela - 80 x 60
Acervo de Marcelo Augusto Neves

MAGIA NEGRA
(José Maria Honorato)

Eu tenho versos
Versos negros
Iorubás Bantos
Congos Jêjes

Eu tenho versos
Versos negros
Transformados
Ao longo do mar
Ao longo das costas

Eu tenho versos
Transportados
Nos tumbeiros de alto mar
Transbordados em versos
Brancos de além mar.

FAZENDO LINGUIÇA - óleo sobre tela - 70 x 50
Acervo de Roberta (Dionísio/MG)

MATAPÁ
(José Maria Honorato)

1 sonho Nagô
2 porções Bantos
Congo à vontade
Ervas de Angola
Um bocado dos sorrisos
Que ficaram Além de Bojador
Pitadas dos sonhos
Jogados ao mar
3/4 dos amores pedidos
Na pele da noite.

LAVADEIRA - mista sobre tela - 50 X 40
Acervo de Anselmo José Domingues

FILHOS DE CAM
(José Maria Honorato)

Ao redor há todo o mundo
Ao redor há toda a vida.
Há Ganga Zumba
Zumbi
Há pelourinhos
Há sonhos e reinados 
De além mar
Mas, aqui estou eu!
Ao redor está ele, o passado.

José Maria Honorato e José Rosário, noite de abertura da
exposição OLHAR A ÁFRICA: VER O BRASIL,
Fundação Arcelor/Mittal Acesita, Timóteo/MG.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

DE MÃOS DADAS COM O INIMIGO (José Rosário)

ALBERTO VASQUEZ - Imersão - 70 x 50

Parentes, amigos, conhecidos, colegas de escola e serviço, ou até mesmo você, já viram ou já ouviram falar muito delas. Já é quase praticamente impossível alguém que não tenha próximo a si, um outro alguém envolvido com elas.
Estão em todos os lugares, vestidas das mais diversas classes sociais, entranhando poderes e consumindo vidas, fantasiando sempre de portas fáceis para grandes aventuras, ocultando em atitudes tão maliciosamente enganadoras e perversas.
Todas os dias, sempre sorrateiramente, elas abraçam vorazmente pessoas que queremos tão bem. E se colocam assim, tão familiares a nós... É que na luta louca de salvar a quem gostamos, chegamos quase aprender a conviver com elas.
Não se deve e nem se pode desprezar quem as usa. Já nem digo que se deve e se pode combate-las, isso já se tornou quase impossível. Mas, com toda força que nos for possível, todos devemos evita-las. Acho que é uma das maiores provas de livre arbítrio que se pode enfrentar ultimamente. E não são poucos os que perdem essas batalhas... Drogas nunca selecionam vítimas, acolhem a todos...

ALBERTO VASQUEZ - O túnel - 170 x 122

Vasculhando alguns papéis de gavetas, encontrei um poema bem oportuno para o tema. Engraçado como conseguir ser poético com algo tão trágico. Mas, a arte sempre se mostra mais verdadeira nas melancolias e tragédias. Penso que todo poeta tem sempre uma lágrima pronta a derramar. Derrama em versos, assim enxuga a alma.

 Gladiadores
(JOSÉ MARIA HONORATO)

No cabeço dos morros da cidade,
uivando sob moderno tapete de amianto,
nossos irmãos do barro,
em libações rubras nos becos, 
escaravelham novos retratos da vida.
Adolescem em potes lustrais nas ruas,
e ciliam poesias em versos brancos e negros, quebrando esquinas mudas !

Bichos soltos nos guetos ricos de melanina, 
nossos meninos são coisas.
São pipas nos becos da extrema-unção de ferro em precoce fundição !

Malham no caos que decapita  pirilampos
expostos ao cânhamo precipício.
No escolho dos rastos da alcatéia
festejam rajadas de pó e fiam sonhos nas valas.
Faiando tortos nas linhas mortas,
revelam berros nas  páginas da noite. 
Vão embalados em diálogos mortos na arena com a multidão !

Subindo escadas do sábio barqueiro
jovens veteranos do sofrimento
rompem grilhões 
fogem da estrela fria
saltando às asas da rabiola viva. 
Voleando o tempo,
nossos meninos lucílios desprezam esmolas
grafam berros de endorfina
e lançam  a cor na história, arriscando o dia.

Corre a bola ! Sob o luar de prata Deus sabe das coisas tortas !

ALBERTO VASQUEZ - PARA ONDE VOU AGORA? - 130 X 200