Certos fatos ou pequenos detalhes do dia são como uma espécie de gatilho para nos conduzir a lugares e coisas guardados em algum espaço da mente. Somos pescados por eles e, meio sem explicar, voltamos anos, décadas... Como por mágica, ficamos lá por um breve intervalo de tempo, recordando, revivendo, dentro do que é possível reviver e recordar. Dizem que isso é nostalgia. Analisando a morfologia da palavra, até que o sentimento ganhou mesmo um apelido correto.
Geralmente pinto ouvindo algo. É meio intuitivo! Ao entrar no ateliê, ligar o aparelho de som é tão mecânico quanto abrir as janelas. Com a música, previamente escolhida, me isolo dos barulhos externos com mais facilidade. Barulhos “novos” é que nos distraem. A música não, já conheço quase todas as notas daquilo que escolho, portanto já não me distraio mais, me concentro. Hoje, como sempre faço todos os dias, peguei algo na estante pra ouvir. “Echoes”, do Pink Floyd, uma longa faixa do álbum “Meddle”, que não ouvia faz um bom tempo. E, por capricho da minha estratégia, não me concentrei, me distraí. Imediatamente fui pescado para emoções e lugares que o corpo já não lembrava mais.
Na década de 80, Belo Horizonte era a capital do rock no país. O rápido deslanchar de bandas como Sepultura, Sarcófago, The Mist, Overdose, Witchhammer e outras, garantia à BH o título de “Bay Area” brasileira. E no aquecer daqueles anos, gravadoras surgiram, selos foram criados e lojas se abriam em todos os cantos.
Saía de minha cidade, para ir lá apenas conferir as novidades do que era lançado. Ainda não havia a internet e as notícias não tinham a velocidade de hoje. Algumas revistas mensais eram esperadas com ansiedade, mas, o que encantava mesmo, era a visita às várias lojas da Galeria Praça 7 e a ida sagrada à Cogumelo, da Augusto de Lima. Havia sempre muita emoção a cada título lançado. A arte das capas, que a cada lançamento esmerava ainda mais e a qualidade das gravações que saltava aos ouvidos a cada faixa reproduzida.
Mas, o tempo não pára, e tudo muda tão rápido. Que a internet facilitou muita coisa, não há a menor sombra de dúvida. Certamente, algo se perdeu. Encontrar os amigos, trocar novidades colhidas aqui e ali como um garimpeiro musical e socializar experiências, ficaram um pouco pelo caminho.
Ao final da faixa, já de volta aos tempos atuais, coloco mais uma música. A tela em branco ainda me espera!
JOSÉ ROSÁRIO - O gaitista
Óleo sobre tela, 50 x 60
Detalhe 1
Detalhe 2
Que belo texto Rosário!, assim como você eu tbm só pinto ouvindo música, mas vou um pouco alem, ponho fone no ouvido para que nada mais seja ouvido que não seja a música, assim a chance de desconcentrar é menor, e fico algumas horas sem noção do tempo ao som de um bom metal, o que inclui o Sepultura mencionado em seu texto! rs...
ResponderExcluirGosto muito quando posta seus trabalhos aqui, "O gaitista" esta lindo! Pinceladas expressivas, controle da palheta, enfim, um belo trabalho!
Abraço!
Valeu Leonardo. O metal está mais underground agora. Melhor assim, que desgasta menos. Vida longa para nossa música!
ResponderExcluirA tela ficou primorosa, o texto nostálgico está repleto de verdades. O mundo realmente não é mais o mesmo, mas mudou para melhor, pois como eu poderia conhecer o seu trabalho se não fosse a virtualidade?
ResponderExcluirRachel
Concordo Rachel, apesar de achar que às vezes as amizades estão ficando virtuais demais. É um bom assunto para uma boa roda de Filosofia! Obrigado pela presença.
ResponderExcluirTambém costumo pintar ouvindo música... fundamental. Principalmente quando escolhida a dedo para sintonizar com o que queremos atingir dentro da atmosfera da pintura. Pintura espetacular essa sua. Muito solta, com um frescor muito característico do alla prima. Bravo!
ResponderExcluirRosario que prazer de descobrir seu blog e de ter uma oportunidade de ler um pouco de p0rtugues que infelizmente estou esquecendo.
ResponderExcluirMarie
Oi José Rosário,
ResponderExcluirSó para dizer que sou apaixonado pela sua arte, tenho 3 telas suas. Um grande abraço
Marcus Lopes
Marcus, muito bom receber sua visita e mais ainda saber que gosta de meu trabalho. Abraço, estarei sempre por aqui!
ResponderExcluirOLÁ, AMIGO ! Surpresa boa saber que ouves um bom acorde setentista ! Aliás, assim como ZORN ao reduzir a paleta, criou a chave universal da harmonia pictórica, que encontramos em SOROLLA, SARGENT, FECHIN,KROYER, etc...,a redução de acordes musicais gerou a maior e mais genial revolução sonora da história, o rock. Eu também não abro mão de LED a DAMN LASER VAMPIRES, na hora de pintar, embora desse último eu seja muito suspeito a falar, pois a fera é meu mais jovem e talentoso irmão.
ResponderExcluirabraços!
Selistre
Legal saber que há mais artistas na família. Vou procurar pelo som dele.
ResponderExcluirMais uma vez, obrigado pela grata visita!