quarta-feira, 15 de junho de 2011

FACCHINETTI

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista de Teresópolis (detalhe)
Óleo sobre tela - 48 x 100,3 - 1892 - Coleção Fadel

Para certos artistas e suas obras, a admiração cresce proporcional ao nosso envolvimento com o que produziram e pelos fatos que relatam como foram suas vidas. Não me era muito familiar, até pouco tempo atrás, a referência de Facchinetti na história da pintura brasileira. Já havia visto alguns poucos trabalhos dele, mas, a curiosidade me foi despertada pela insistência do Paulo de Carvalho, artista carioca que tem o Facchinetti como cartilha de cabeceira.

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Escola Naval de Angra dos Reis
Óleo sobre tela - 49 x 101 - 1869 - Museu de Arte de São Paulo

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Ilha de Paquetá
Óleo sobre madeira - 24 x 63 - 1881 - Coleção particular

NICOLAO ANTONIO FACHINETTI
Margem da Lagoa Rodrigo de Freitas
Óleo sobre tela - 1888

Comecei então a procurar e pesquisar algo mais sobre esse artista italiano, nascido na cidade de Treviso, a 7 de setembro de 1824. A sua história se mostrou tão rica quanto as suas obras, das quais consegui algumas imagens para compartilhar.

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Cascata do Itamaraty, Petrópolis
Óleo sobre tela - 65,8 x 48,7 - 1869 - Coleção Braziliana

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Cascata dos Bulhões, Petrópolis
Óleo sobre tela - 65,8 x 48,6 - 1869 - Coleção Braziliana

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista da Lagoa Rodrigo de Freitas
Óleo sobre tela - 1887

Facchinetti não veio para o Brasil pelo melhor dos motivos. Desavenças com políticos de sua terra natal aceleraram a sua vinda. Pouco se sabe, ou quase nada, de sua formação artística. Certeza mesmo, é que essa não era a sua maior vocação. Como precisava se manter de alguma forma, na nova terra que seria sua nova casa, tornou-se assim que chegou, instrutor de italiano e desenho. A carreira, por vias das circunstâncias, acabou evoluindo para cenógrafo e finalmente retratista. Mesmo que ele fosse preparado tecnicamente para enfrentar as dificuldades do retrato, a concorrência com outros artistas bem mais conceituados, no cenário carioca daquela época, não lhe deixava em boas condições, pois para tal atividade não era mais que um dedicado amador.

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Enseada de Botafogo
Óleo sobre tela - 51 x 87 - 1869 - MASP

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Cais da Praça D. Pedro I
Óleo sobre cartão - 13 x 18,5 - 1893 - Coleção Fadel

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista da Baía de Guanabara
Óleo sobre tela - 22,4 x 47,3

Sem muitas alternativas, a paisagem entrou no tema de suas composições quase que intuitivamente. Natural da região do Vêneto, na Itália, é até fácil de entender porque o realismo que tanto perseguia em suas obras, logo se tornou a marca registrada de seu trabalho. Mesmo sendo, na segunda metade do século XIX, a paisagem considerada um gênero inferior de representação artística, Facchinetti não se abateu diante de sua escolha. O lirismo realista de toda atmosfera brasileira que exalava de seus trabalhos, feitos aliás com muita habilidade e até um certo preciosismo, foi naquele momento, o cartão de visitas para ser assediado, em pouco tempo, pela alta sociedade fluminense. Não tardou e o reconhecimento veio logo pela família imperial, que o congratulou mais posteriormente, com o título de pintor oficial da família imperial.

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Fazenda em Teresópolis
Óleo sobre tela - 22,5 x 46,1

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Fazenda Flores do Paraíso
Óleo sobre madeira - 54 x 73 - 1875 - Coleção particular, SP

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Chalé no Vale do Quebra-Frasco
Óleo sobre tela - 26,5 x 51 - 1893 - Coleção particular, RJ

O domínio técnico a que chegara, dava a seus trabalhos um diferencial que não era visto em nenhum outro pintor de sua época. Pela força das circunstâncias, Facchinetti inaugura assim, um estilo que por muito tempo, parecia só seu. É nas ocasiões de extrema necessidade, que a originalidade se manifesta como a maior das virtudes.


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Lagoa Rodrigo de Freitas, morro dos Dois Irmãos
Óleo sobre tecido - 21,7 x 30,6 - Coleção Braziliana

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Lagoa Rodrigo de Freitas, com o Corcovado
Óleo sobre tecido - 22,2 x 28,8 - Coleção Braziliana

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Sapucaia, RJ
Óleo sobre tela - 1880

Certas habilidades nascem quase sempre de rigorosos métodos, Facchinetti cultivou os seus por toda a sua vida. Um minucioso processo de concepção de todas as suas obras, demandava um bom tempo para a execução das mesmas. Na procura pelo melhor ângulo da cena a ser representada, ele superava os maiores desafios. Em momento algum, hesitava em correr riscos pelos ângulos obtidos de pontos perigosos, pois estava sempre à procura da visão perfeita, aquela que viesse a se transformar na sua cena ideal. Ali esboçava à lápis, o que seria posteriormente ampliado em carvão e fixado à tela. Não abria mão desses recursos feitos “ao natural”. Essa prática, de buscar a inspiração para as suas obras, diretamente da natureza, se tornaria mais tarde, atividade também praticada por artistas guiados por Georg Grimm, entre eles, os renomados Castagnetto, Antônio Parreiras, Domingo Garcia y Vasquez, Hipólito Caron e muitos outros paisagistas do final daquele século. Porém, a diferença fundamental entre Facchinetti e Grimm e sua turma, é que o primeiro não pintava ao ar livre, apenas utilizava seus fartos esboços para compor a cena em ateliê. Já Grimm, incentivou todos os seus a captarem a cor in locco, numa atitude bem parecida com a Escola de Barbizon.


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Barreira do Rio Soberbo
Óleo sobre madeira - 36,5 x 51 - 1881 - Coleção Fadel

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Fazenda Soledade, Teresópolis

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista do Morro do Pão de Açúcar
Óleo sobre tela - 56 x 79,5 - 1868 - Coleção Fadel

Gonzaga Duque, contemporâneo de Facchinetti, deixa o importante relato:

“Antes de pintar, ele ia ao local, estudava o ponto, esquadrinhando todos os detalhes. Depois tracejava o motivo em separado, numa página de álbum, numa folha de papel, que lentamente completava.
Preparado com esse exato desenho, decalcava-o na tela, a carvão, cobria-o com grafite e terminava fixando-o com tinta comum, por meio de aguda pena de aço.
Uma ocasião, estranhando-lhe eu todo esse lento, meticuloso processo, que anulava a emoção, respondeu-me que o seu interesse era a verdade, quanto mais exata, mais acabada fosse a cópia, tanto maior seria o mérito do seu trabalho...”


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Lagoa Rodrigo de Freitas, RJ
Óleo sobre painel - 23 x 65 - MNBA-RJ

Detalhe 1

Detalhe 2

O efeito quase fotográfico de seu trabalho, restringiu um pouco a dimensão de suas obras. Quase todas em pequenos formatos, conservam todas elas o minucioso cuidado com todas as proporções, formas e cores, chegando a exagerar um pouco a tonalidade, em algumas obras. Os trabalhos eram quase sempre encomendas dos Barões do Café, membros da alta sociedade do Rio de Janeiro, e todos muito ligados à corte imperial. O destino de grande parte de sua obra era a ornamentação de salas e gabinetes, ou como sofisticados souveniers, oferecidos como presentes entre os grandes nobres.


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Fazenda Montalto
Óleo sobre tela - 46,5 x 106 - 1881 - Coleção Fadel

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Recanto da Praia de Icaraí
Óleo sobre tela - 29,2 x 57,5 - 1869 - MASP

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista de Teresópolis
Nanquim branco, preto e sépia sobre papel
45,2 x 59,8 - 1863 - MASP, São Paulo

Facchinetti teve o privilégio de viver no Brasil numa época prolífica. Grande parte das revoltas armadas contra o governo, em diversos pontos do território nacional, já havia sido sanada. Esse fato, que dava ao governo uma consolidação de poder, gerou para os próximos anos, um período de abonança de recursos, o que favoreceu o crescimento do mercado interno da arte. Com todas as benfeitorias centralizadas na então sede da corte, é bem natural que o Rio de Janeiro fosse o centro do país por onde a arte se solidificava e produziu vários artistas. É nesse ambiente, imensamente acolhedor do produto de seus artistas, que Facchinetti atendia uma clientela abonada e sedenta por obras. Produziu quase todas as suas obras por encomenda, fato comprovado no verso de todos os trabalhos solicitados. Muito raramente se dava ao luxo de produzir um trabalho sem destino prévio.


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista do Rio de Janeiro, tomada de Santa Tereza
Óleo sobre tela - 74 x 92,2 - 1892 - Museu do Açude, RJ

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
São Tomé das Letras
Óleo sobre tela - 52,2 x 92 - 1876
Museu Nacional de Belas Artes, RJ

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Lagoa Rodrigo de Freitas, Corcovado, Ipanema e Leblon
Óleo sobre tela - 1869

“Segundo Gonzaga Duque, Facchinetti superou barreiras e a ausência de recursos técnicos para conceber suas obras.  Facchinetti escapa à perícia da fatura, era teimoso, persistente, rebuscado. Pela ausência de recursos técnicos, que só a tenacidade do querer, a constância do desejo, o amor à profissão, poderiam recompensar. E tais méritos lhe sobravam. Um organismo menos dotado de vigor teria sucumbido pelo esfacelamento. Não obstante, ele triunfou desse penoso trabalho, coadjuvando por seu bom senso, ainda provado com a escolha dos motivos, que eram paisagens panorâmicas. O panorama em quadro, ou mais em vulgata, para melhor compreensão, a vista, como ele fazia, será materialmente trabalhosa, mas oferece vantagens: sobre o acordo com a maneira comum de sentir, tem a dos planos bem detalhados e da perspectiva aérea.  A paisagem representava para Facchinetti não só motivo para inspiração, mas também servia para seu deleite pessoal, ao entrar em contato com a natureza o pintor não só reproduzia suas sensações, como era tomado por elas diante da magnitude da paisagem. Facchinetti em suas telas representava o amor e o idealismo pelas cores do Brasil.”
(Trecho extraído do site www.Dezenovevinte.net)


NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista de casa de fazenda
Lápis, guache e tinta sobre papel - 30,8 x 42

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Pátio de casa de fazenda
Lápis, guache e tinta sobre papel - 29,8 x 42,5

NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Vista de fazenda
Lápis, guache e tinta sobre papel - 31,3 x 42,8

Assim como muitos outros artistas de terras distantes, que fizeram daqui sua morada, Facchinetti não só contribui para o importante registro iconográfico de uma época, mas também faz, como todos aqueles artistas, um declarado amor à sua nova casa. Muito do que sabemos de um período já distante de nossa época, deve diretamente a todos aqueles que não mediram esforços para que as notícias de seu momento, chegassem o mais longe possível, no tempo e no espaço.




NICOLAO ANTONIO FACCHINETTI
Nasceu a 7 de setembro de 1824,
em Treviso, Itália
Falecido a 16 de outubro de 1900, 
em Engenho Novo, Rio de Janeiro

8 comentários:

  1. finalmente, o grande facchinetti! sempre acho que uma foto de obra não substitui a visão in loco de um quadro. isto é sempre mais verdadeiro com o facchinetti. tive o privilégio de visitar por três vezes uma fantástica exposição sua no ccbb do rio em 2004. fui até chamado a atenção pelos seguranças por me aproximar excessivamente de seus quadros, rs...sua pintura é um fascínio pelos detalhes, pelo extremo esmero. quem nunca esteve a centímetros de um quadro dele, não sabe o que perde! é, para mim, um "artista de cabeceira". agora o josé rosário pode passar seus dias mais tranquilos,rs. aliás, ainda não. falta-nos agora o bierstadt! paulo de carvalho

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  2. É Paulo, você já está me dando bastante trabalho. Obrigado por apresentar o Facchinetti e recordar o Bierstadt. Minha história com o segundo é bem mais longa! Valeu pela visita!

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  3. o dia que puder, veja um quadro dele bem de perto, se é que já o não tenha visto. considero-me, como disse antes, um privilegiado por ter visto aquela baita exposição dele no ccbb, pois tenho certeza, nunca mais conseguirão juntar tanta coisa sua no mesmo espaço. eu o teria convidado, se o conhecesse à época, a vir ao rio só para isto, teria valido à pena. vamos lá, coragem! o bierstadt merece mais um belo post seu...
    abraço, paulo

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  4. Parabéns pelo post !!!! Com ele descobri que Facchinetti também era teimoso , persistente e rebuscado. Assim como o nosso Paulo de Carvalho rsrsrs
    Cristina Lima

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  5. Olá Cristina, não sabia que o Paulo e o Facchinetti tivessem tanto em comum. Conhecendo um melhor, acabo por conhecer o outro! Obrigado pela visita!

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  6. realmente temos muito em comum: o detalhismo, a persistência, os poucos alunos e as encomendas de quadros. apenas algo nos separa: cheguei com 130 anos de atraso, rs...
    paulo

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    1. Paulo, vi seus quedros aqui na internet, e agora vendo os do Facchinetti , senti uma identificação entre ambos. Aliás isso não quer dizer nada e não tem demérito nenhum. Estou esperando algumas fotos dos quadros que meu avô ( pintor desconhecido pelos que não conviveram com ele), mas que mesmo não sendo tão detalhado, me lembra vc e o Facchinetti. De qualquer maneira , parabens , vc pinta muito !!
      Postei uma aquarela que meu avô fez de Teresópolis, se vc quiser dar uma olhada , está nos meus posts.Essa aquarela, acredito, é um estudo para os à óleo que ele pintou. Abraços e receba minha admiração.
      Yvonne Kikoler

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    2. Obrigado pela vinda, Yvonne. Espero que o Paulo possa ler sua mensagem.
      Abraço grande!

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