CARAVAGGIO - Narciso
Óleo sobre tela - 122 x 92 - 1599
Galleria Nazionale d'Arte Antica, Roma
Essa obra do Caravaggio é mais que apropriada para iniciar essa matéria. Narciso é um personagem da Mitologia Grega, um rapaz com beleza sobrenatural, que apaixonava a todas as pessoas que o olhavam, por isso foi obrigado a viver isolado em uma ilha, para que ninguém corresse o risco de cair em tal tragédia. Um dia, ao se encaminhar para um canto de rio, para beber água, viu seu reflexo e não conseguiu sair mais dali, morreu apaixonado pela própria imagem. É uma narrativa interessante sobre a atração que o homem tem sobre si mesmo, imagem um tanto quanto exagerada nesse caso, é claro, mas uma pequena demonstração de como a sua própria figura o atrai.
Vênus - Pré-história
Desde quando começou a se manifestar artisticamente, representar a si próprio nas obras que produz tem sido uma prática milenar e constante. Nas cavernas, o homem já se incluía nos primeiros desenhos, e a escultura de uma “Vênus” paleolítica, é uma das mais antigas expressões artísticas retratando uma mulher. Tem as formas exageradas, o que deve ser uma alusão direta à fertilidade, e carrega uma beleza plástica com leitura quase contemporânea. Assim, “apaixonado” pela própria imagem, o homem vem se expressando nas mais diversas formas e nos mais diversos efeitos e técnicas. Chegou a patamares de perfeccionismo inimagináveis e produziu deformações que exibiram uma auto imagem nunca antes pensada. Faremos uma breve viagem pelo tempo, quando essa auto admiração começou a ganhar proporções relevantes.
Arte egípcia
Com exceção de algumas antigas civilizações e de alguns pouquíssimos povos da atualidade, todos os grupos humanos sempre produziram imagens de si mesmos. Seja apenas para ornamentar ou para narrar suas trajetórias. Os egípcios criaram uma imagem relativamente avançada para seu tempo. A arte nessa época era restringida aos palácios e templos, pois os únicos empregadores de artistas, se não eram governantes, eram sacerdotes. Conseqüência disso, é que grande parte da produção artística egípcia daquele período, consistia na representação de oferendas a deuses ou em monumentos comemorativos das façanhas de seus governantes. Convivendo em uma sociedade rica, os artistas egípcios eram, contudo, quase anônimos. Subordinados aos trabalhos a que eram designados, viam suas personalidades se desaparecerem atrás de suas obras. É praticamente impossível identificar os artistas que compunham tais obras. Um fato interessante na arte pictórica egípcia, em todas as suas fases, é a maneira racionalista como abordam sua técnica. A forma completamente singular de suas imagens é realçada pela falta de perspectiva, à inexistência de escorços e uma abordagem quase sempre primitiva. Estão sempre representadas em posição lateral, o que confirma que em todo instante, não estavam intencionados em ludibriar a informação desejada, criando efeitos naturalistas em suas produções.
Vênus de Milo
Mármore Parian - 202 cm de altura - entre 130 e 120 a.C.
Museu do Louvre, Paris
A Grécia inaugura a grande fase da arte naturalista na história da humanidade. Acompanhado do desejo de reproduzir cada vez mais fielmente a figura humana, surgiu a valorização dos artistas, numa esfera mais individual e mais parecida com a que conhecemos hoje. Prova disso é que já em 700 a .C. as obras comecem a ganhar assinaturas. Mas é no século V a.C. que o Classicismo ganhou ares de sofisticação. Não bastava apenas representar realisticamente a figura humana, os escultores se embrenhavam na procura de uma beleza que fosse o cume da proporção e da ordem. O ideal de beleza grego é valorizado até hoje em todas as principais academias de desenho. O fim da arte helênica dá início ao predomínio da Arte Romana, que inicia com uma excessiva valorização da escultura e vai acrescentando, paulatinamente, a pintura em suas representações. A figura humana conquista a era dos retratos. Já não era mais desejada apenas uma representação de escultura ou pintura quaisquer. Quem as encomendava queria agora ver a sua própria imagem.
RAFAEL - Transfiguração
Óleo sobre tela - 405 x 279,5 - 1520
Museu do Vaticano
MICHELANGELO - A criação de Adão
Afresco - 280 x 570
Capela Sistina, Vaticano - 1510
Há um certo conflito, e até diria uma desnecessária tendência, em posicionar o momento verdadeiro de surgimento do período Renascentista. Muitos o iniciam à partir do Iluminismo, mas é mais coerente acreditar que as coisas não surgiram todas no século XV, mas que começaram a sofrer sérias transformações no século XII. Porém, é no Quattrocento italiano que a arte, principalmente a pintura, assina uma linha divisória nitidamente perceptível da arte medieval, assumindo uma extraordinária liberdade na composição e ganhando graça, elegância, perdendo o peso estatuesco e se impregnando de linhas cada vez mais harmoniosas em sua forma. Enquanto a característica básica da arte gótica é a justaposição; como se a obra possuísse várias mini-obras inseridas dentro dela; no Renascimento todos os conceitos de composição são revistos. É à partir daí que nasce a idéia de conjunto, de um quadro sendo visto pelo todo, e até mesmo de uma construção abrigando vários elementos representarem um motivo coeso e interrelacionado. A figura humana é tratada com respeito, mas não é absolutamente mais importante que o ambiente que a integra. O Alto Renascimento culmina nas mãos mágicas de Rafael, Da Vinci e Michelangelo. Todos comprometidos em representar a figura humana no mais alto ideal que essa já pode receber. Serão necessárias muitas outras matérias para descrever essa importante fase da história da arte.
FRANÇOIS BOUCHER - Nu em um sofá
Óleo sobre tela - 59 x 73
No Barroco, o que havia de frio, intelectual e calculista do final da Renascença, deu lugar a uma arte sensual, emocional e facilmente assimilável. A figura aqui, ganha mais movimento e assume ar mais teatral. Também assume ares mais naturalistas, e tende cada vez mais, a agradar o gosto de uma grande massa de novos consumidores. A arte começa a deixar o ambiente palaciano e a se integrar na vida provinciana, até ser suplantada definitivamente pelo subjetivismo burguês, nascendo assim o Rococó, que traz a representação artística para uma qualidade mais delicada e mais íntima. É a era que se instaura a representação de imagens com “carnes fartas”, bem contraditórias do ideal de beleza atual.
JACQUES-LOUIS DAVID - Mulheres sabinas
Óleo sobre tela - 385 x 522 - 1799
Museu do Louvre, Paris
A Arte, assim como qualquer outro segmento, é cíclica. Comportamentos vão e voltam por motivos variados. Aos excessos de liberdade que o Rococó parecia sucumbir, surgiu uma nova corrente, alimentada pelos grandes governantes, e que visava restabelecer o ideal das artes clássicas. O Neoclassicismo perdurou por um bom tempo e deu origem ao Romantismo, que avançou influenciando até a metade do século XIX. Nesse período, a figura humana é revisitada em ideais que lembram os gregos e romanos, mas foi perdendo força, assim que o século XIX avançava.
EDOUARD MANET - Almoço na relva
Óleo sobre tela - 208 x 265,5 - 1863
Museu d'Orsay, Paris
VAN GOGH - Autorretrato com orelha enfaixada
Óleo sobre lona - 51 x 45
Considero o século XIX o divisor de água na História da Arte. É nele, que de uma forma abrupta, se fazem todas as rupturas com os estilos e tendências. Da liberdade assumindo seu significado mais completo da palavra, prenunciando todas as grandes revoluções vivenciadas no século XX. A representação da figura humana, à partir daí, é a interpretação pura e pessoal de cada artista. Começa com o Naturalismo e Realismo, liberta-se definitivamente com o Impressionismo e vai avançando os anos em visões Expressionistas , Surrealistas, Modernistas e Concretas. Já não nos mostram como somos visualmente, mas como nos comportamos a nível emocional. Chegamos ao presente e continuamos a nos procurar.
AMADEO MODIGLIANI
Retrato de Jeanne Hebuterne em um grande chapéu
Óleo sobre tela - 54 x 37,5 - 1918
ALBERTO GIACOMETTI - Homem caminhando
ANDY WARHOL - Marilyn - Técnica mista - 1967
DAMIEN HIRST - Ressurreição
Instalação
Viemos até aqui tentando entender um pouco do passado. Dizem que essa é a melhor maneira de melhorar o presente, e parece ser mesmo uma verdade imutável. Continuamos a nos representar, fascinados pela nossa própria imagem, assim como Narcisos apaixonados por si mesmos. A figura humana será sempre a mais alta busca na representação artística que produzimos. Jamais findará para o homem, a eterna busca de se encontrar.
Pode deixar, vou me preparar para vivê-lo.
ResponderExcluirTenha também um excelente ano. Obrigado por passar aqui!
Mais uma grande aula para quem, diletante como eu, aprecia a pintura. Obrigado.
ResponderExcluirTenha um ano magnífico, abraços.
Macário, tenha também um grande ano. E que tenhamos fôlego para caminhar com a arte durante todo ele.
ResponderExcluirGrande abraço!
Belo texto... Uma aula de História da Arte! Beijos
ResponderExcluirPara quem gosta de arte como eu, sempre ira apreciar uma aula como essa, parabens, e que Deus te abençoe neste ano que começa.
ResponderExcluirAna e Mário, bom que passaram por aqui. Que tenhamos a oportunidade de encontrar muitas outras vezes por esse ano.
ResponderExcluirGrande abraço!
Leve e instrutivo; uma aula de muito bom gosto e agradável de ser curtida. Parabéns pelo bom conteúdo e bom gosto de sempre. Feliz ano novo!
ResponderExcluirObrigado Fábio, pela visita.
ResponderExcluirTambém tenha um excelente ano. Grande abraço!
Zé, excelente trabalho! Parabens!
ResponderExcluirOlá José Maurício, bom ver você por aqui!
ResponderExcluirGrande abraço.
Olá! Parabéns pelo blog!
ResponderExcluirObrigado pela visita, Dani!
ResponderExcluirUm grande abraço!
Belíssimo poder de síntese, estou encantado, PARABÉNS E GRATO pelo despojamento.
ResponderExcluirGrato Ivan. Bom encontrá-lo por aqui.
ExcluirGrande abraço!
estava preçisando para trabalho muito obrigado
ResponderExcluirLegal que tenha sido útil.
ExcluirAbraço, Nathan!
ótimo texto.Parabéns, vou usá-lo para o meu trabalho escolar.
ResponderExcluirAdorei!!!
Fique à vontade.
ExcluirObrigado por vir!